1. A crise econômica e de saúde ainda impactará a população brasileira.
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- A crise na qual o Brasil está entrando pelas consequências da pandemia global deverá ser pior do que a crise econômica que o país experimentou a partir de 2014. O desemprego, atualmente em 13,3% segundo a PNAD, do IBGE, deverá chegar a 17,8% da população economicamente ativa, um recorde histórico, segundo o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). Pela primeira vez na história, a PNAD do IBGE contou mais brasileiros adultos não trabalhando do que trabalhando.
- Ao mesmo tempo em que enfrenta uma diminuição da renda, o brasileiro também deverá encontrar serviços de saúde com financiamentos menores. Para 2021, o Ministério da Saúde terá um orçamento de R$ 127,6 bilhões, corte corte de 4,8% em relação ao planejado para 2020. Com os custos extras atrelados à pandemia, o orçamento da saúde em 2020 ficou em R$ 174,8 bilhões.
- O cenário se mostra ainda mais preocupante se considerarmos que, durante crises econômicas, os brasileiros tendem a abandonar planos de saúde privados e dependerem do Sistema Único de Saúde. Desde 2014, os planos de saúde privados perderam 3,5 milhões de consumidores. Com o Brasil prestes a voltar a uma grave crise fiscal, espera-se que os investimentos em saúde não acompanhem o aumento na demanda.
2. As desigualdades sociais, econômicas, educacionais e de acesso a internet e tecnologia seguirão existindo no Brasil
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- O desemprego e a diminuição da renda causados pela pandemia deverão atingir muito mais os pobres do que os ricos. Estudo do Instituto Mundial das Nações Unidas para a Pesquisa Econômica do Desenvolvimento (UNU-WIDER) aponta que 14,4 milhões de brasileiros deverão ser jogados na pobreza (viver com menos de US$ 5,50 por dia) como consequência da pandemia. A distribuição do auxílio emergencial de R$ 600 teve um impacto tão grande nesse grupo que a extrema miséria no Brasil (quem vive com menos de US$ 1,90 por dia) caiu para seu menor índice em 40 anos, segundo a FGV. A crise fiscal, porém, significa que o auxílio não poderá ser eterno, o que indica que a extrema pobreza deve aumentar.
- Há outros indícios dessa diferença de impacto. Pesquisa da Plano CDE mostra que, entre março e maio, “51% dos brasileiros das classes D e E, com renda per capita de até R$ 500, perderam metade ou mais de suas rendas, em um contingente de 58 milhões de pessoas”, segundo reportagem da Folha. Para as classes A e B, o índice ficou perto de 30%. Além de a renda cair mais fortemente para os mais pobres, o IPEA descobriu que a deflação registrada para todas as classes sociais durante a pandemia foi mais acentuada para os ricos do que para os pobres. Em maio, os dados do Ipea mostraram que, para famílias com renda muito baixa a deflação foi de 0,19%. Para as famílias de renda muito alta, o índice foi de 0,57%.
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Ou seja: os pobres ganham menos e pagam mais durante a pandemia. Não parece haver outro caminho aqui que não o aumento da desigualdade, que impacta todas as áreas da vida do cidadão, como educação e acesso à internet. O Índice de Gini já vinha subindo nos últimos anos como consequência da crise de 2014, segundo cálculo da FGV Social baseado na PNAD Contínua. Dado que os efeitos dessa crise econômica se mostram piores que os da anterior, é seguro esperar que o Índice de Gini continue a aumentar.
3. A evasão escolar aumentará
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- A crise econômica deverá forçar dezenas de milhares de alunos da rede privada para a rede pública, um movimento que já começou. A Secretaria de Educação do Paraná registrou, entre março e maio, mais de 8,6 mil alunos que fizeram a transição. Ao mesmo tempo, espera-se um aumento no trabalho infantil - muitas famílias, com a renda em queda, deverão tirar seus filhos do colégio e colocá-los para trabalhar, segundo a UNICEF. De acordo com pesquisa do Datafolha, dos pais que admitiram que seus filhos poderiam abandonar os estudos, 5% citaram a necessidade de que eles trabalhassem para complementar a renda da família.Em 2016 (dado mais recente), o Brasil tinha mais de 2,4 milhões de crianças trabalhando, sendo que 64,1% eram negras, segundo o IBGE.
- Dado o cenário, é muito provável que a evasão escolar reverta a tendência de queda registrada na última década e volte a crescer. No ensino fundamental, a evasão caiu de 5% em 2008 para 2,7% em 2017. No ensino médio, foi de 14,2% em 2008 para 9,1% em 2017.
- O Brasil paga caro pela evasão. Segundo cálculo feito por Ricardo Paes de Barros, economista-chefe do Instituto Ayrton Senna e cabeça teórica por trás do Bolsa Família, o país perde cerca de R$ 372 mil para cada jovem que abandona a escola. Com os dados pré-pandemia, o custo da evasão escolar é de R$ 214 bilhões por ano, o equivalente a 3% do PIB. Com a pandemia, o valor, que abarca a queda nas “possibilidades de emprego, renda e retorno para a sociedade das pessoas que não concluem a educação básica”, deverá subir.
4. O educador continuará tendo um papel central no ensino e na aprendizagem.
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- É brutal irreal/utópico esperar que algoritmos tomem o lugar das aulas presenciais em médio prazo. Nessa digitalização atabalhoada dos ensinos pedagógicos, professores terão alguns papéis fundamentais, como entender como adaptar da melhor forma as lições e os conteúdos, ao mesmo tempo em que aprendem a conduzir e manter engajados alunos em situações diferentes das encontradas no sistema presencial. Professores terão um papel de farol para entender as possibilidades e limitações das ferramentas digitais e raciocinar como é possível explorar tais ferramentas dentro do plano de estudo tradicional.
- Ainda que já existam sistemas de edtechs que tentam automatizar algumas etapas do processo pedagógico, como, por exemplo, as provas para avaliar o aprendizado do aluno, a sala de aula continua sendo um ambiente em que o/a professor/a reina absoluto/a, ainda que de maneira virtual. Pelo menos em médio prazo, softwares e algoritmos dentro da sala de aula poderão ajudar o profissional, e não assumir totalmente a tarefa.
- Há um outro lado muito importante do educador, principalmente em meio à pior pandemia do século: a necessidade de lidar com a dificuldade que alunos podem ter em enfrentar uma pandemia global e suas consequências – uma criança que perdeu um parente para a COVID-19 não tem (por razões óbvias) interesse em aprender como calcular a hipotenusa. Sentimentos de tristeza e dúvida sobre o que estamos passando exigirão também que o professor adote uma postura quase de “terapeuta”, capaz de acolher e ajudar o aluno a processar.
5. A tecnologia terá um papel importante na educação.
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- Ainda que feita de forma apressada e esteja cheia de lacunas que precisam ser corrigidas, a educação remota durante uma pandemia se mostra uma opção melhor do que nenhuma educação. Segundo pesquisa DataFolha feita a pedido do Itaú Social, Fundação Lemann e Imaginable Futures, 82% dos estudantes das redes municipais e estaduais receberam alguma atividade para fazer em casa durante a pandemia. Em maio, o índice era de 74%. Entre os alunos de escolas estaduais, o número chega a 87%.
- A tentativa de seguir o ensino durante uma pandemia, ainda sem vacina à vista e com informações básicas sobre o vírus continuando a serem descobertas, só é possível por causa da tecnologia. Essa digitalização deverá deixar um legado no sistema educacional brasileiro, seja nas escolas privadas, seja nas públicas. Há uma aceleração forçada na aplicação de softwares e plataformas digitais no processo pedagógico que, com a descoberta de uma vacina, não deverá se reverter 100%. Experimentos que deram certo deverão ser replicados. Sentiremos as consequências daqui para a frente.
- É sempre bom repetir: a digitalização da educação periga aumentar ainda mais o gap educacional que existe entre os alunos mais ricos e os mais pobres. Dados do Cetic.br mostram que quase 70 milhões de brasileiros, principalmente das classes D e E e da zona rural, têm acesso precário à internet. Em São Paulo, por exemplo, mesmo com os esforços da secretaria estadual, a plataforma de ensino digital tinha sido acessada por 1,6 milhão de alunos na metade de maio, menos da metade dos 3,5 milhões de crianças e adolescentes matriculados na rede educacional do estado. A própria secretaria previne: o dado se refere a quem fez login, não a quem acompanhou as aulas. O número de alunos que mantém a rotina de estudos deve ser ainda menor. O problema de infraestrutura privada não se restringe à banda larga. Nas periferias, faltam itens ainda mais básicos, como folhas de papel e lápis, como mostrou reportagem do jornal Folha de S.Paulo em 8 de maio.
- Vale dizer outro perigo: a digitalização das aulas poderá ser usada pelo MEC para reaproveitar conteúdos já gravados e diminuir a carga horária de professores ou até mesmo demiti-los, uma forma de dar vazão ao corte no orçamento.
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- Antes mesmo da pandemia, o problema já era grande: segundo a TIC Educação 2019, elaborada pela NIC.br, mais de 40% dos professores de escolas urbanas nunca utilizaram internet ou computador em sala de aula ou laboratório de informática para dar aulas. Com a pandemia, os professores foram forçados a se adaptar, nem sempre com o treinamento correto.
- Nota-se uma movimentação muito forte das empresas donas das plataformas de ensino remoto em treinamento. É uma política “cada um no seu quadrado”: o Google ensina o Google Classroom, a Microsoft ensina o Microsoft Teams e por aí vai. Os treinamentos são dados conforme a plataforma escolhida, e não existe um direcionamento centralizado do MEC já que também não existe uma estratégia única sobre o método a ser usado. Estados e municípios escolhem as plataformas que lhes parecem melhores. Nessa “visão tecnicista” de ensino, o foco é sempre nas plataformas e com baixa coordenação entre os governos estaduais e municipais.
- Segundo pesquisa feita pelo Instituto Península com mais de 7,7 mil professores entre abril e maio, 83% deles ainda se sentem despreparados para o ensino virtual. O alto índice é consequência direta de um número ainda maior: antes da pandemia, 88% deles não tinham dado aula virtual. Somadas a falta de experiência, a ausência de uma estratégia centralizada de treinamento e o baixo índice de aproveitamento da internet nas aulas antes da pandemia, nota-se que o desafio de adaptar a didática para a tecnologia será grande.
7. Haverá falta de recursos públicos para a educação pública e a tecnologia.
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- Desde 2016, a arrecadação federal estava se recuperando do tombo que tomou a partir de 2013, com a crise econômica. Os indícios para o ano fiscal 2020 são muito ruins: em junho, o Governo Federal arrecadou R$ 86,2 bilhões, queda de 29,6% em comparação a junho de 2019, e o menor número dos últimos 16 anos. Tudo indica que a arrecadação em 2020 será ainda menor que a registrada em 2016, que foi o “fundo do poço” da crise desengatilhada a partir de 2013.
- Essa queda recorde na arrecadação federal deverá ser seguida por cortes no orçamento da maioria dos ministérios, MEC incluído. Comunicado divulgado no começo de agosto afirma que, para 2021, o orçamento da pasta sofrerá um corte de 18,2% nas despesas não obrigatórias. Um quarto do valor estava destinado para universidades e institutos federais.
- O investimento em ciência e tecnologia tem sofrido cortes semelhantes nos últimos anos. Para 2019, o orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações diminuiu 42% e atingiu até iniciativas sobre pandemias emergentes, um ano antes da COVID-19. Mesmo com esse degrau, a pasta só tinha executado 27% do orçamento previsto, segundo monitoramento do IPEA. O cenário já era ruim antes da queda de arrecadação com a pandemia. Não há indícios de que haverá uma reversão completa nessa perspectiva.
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Os cortes não são gerais. Há ministérios que, no sentido contrário, terão um incremento no orçamento. O Ministério da Defesa, por exemplo, deverá ter orçamento 48% maior, saltando para R$ 108,56 bilhões em 2021. A previsão é que a verba do MEC caia de R$ 103,1 bilhões para R$ 102,9 bilhões, o que significa que, pela primeira vez em 10 anos, a verba para educação será menor que a verba para defesa.
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Ao mesmo tempo, há um florescimento no número de edtechs no Brasil. O número de startups de tecnologia focadas em educação saltou de 364 em 2018 para 748 pouco mais de um ano depois, segundo contagem da Associação Brasileira de Startups. O forte crescimento já significa maior interesse de fundos de investimentos privados na área. Caso o governo reforme a lei que baliza as licitações, facilitando a contração dos serviços, o interesse deve aumentar.
8. A sociedade civil brasileira continuará se mobilizando em torno de causas sociais.
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- Com a falta de protagonismo do MEC na definição de uma estratégia educacional para a pandemia, o Brasil está vendo governos estaduais e organizações da sociedade civil ganhando crescente relevância. Estudo do Instituto Península mostra que os principais agentes de transformação da educação durante a pandemia foram as secretarias estaduais de educação, não o MEC, algo possível já que muitas delas se aproximaram da iniciativa privada e de grupos da sociedade civil organizados para pensar e executar estratégias que incluíssem todos os alunos.
- A resistência que algumas organizações setoriais, como Consed e Undime, apresentam a decisões do MEC e a retaliação federal que se segue vêm dando maior projeção a grupos do tipo. A postura altamente ideológica do MEC significa que, na falta de respostas organizadas da pasta em momentos como a pandemia de COVID-19, os grupos da sociedade civil que propõem alternativas, ainda que não sejam seus papéis, se posicionam frente à sociedade.
- Nesse ganho de projeção frente à inépcia do MEC, os grupos podem aproveitar o vácuo de representatividade e liderança para trazer maior atenção à educação no Brasil.